segunda-feira, 28 de março de 2005

Passagem

Ele atravessa o deserto depois da sua libertação. Ainda sente falta das cebolas, das mesas fartas do Egito: antes escravo de um grande amor do que perdido na areia, sem saber para onde ir.

Chegou o tempo da libertação. Antes mesmo que ele percebesse, corria com pães assados sem nem mesmo a massa fermentar e ruminava coisas amargas que ficaram daquele tempo.
Precisava pressa, muito tempo perdido e que deveria ser recuperado.

Ele atravessou o mar, e agora o deserto. Poderia fazer as águas se abrirem antes, mas agora, que será de nós? Uma chama misteriosa vai à nossa frente, leva-nos para um lugar que desconhecemos. Haverá água? Teremos comida? Um repouso em lugar fresco mais à frente, talvez? E amanhã, que será de nós?

E amanhã? Nossa esperança morreu há dias...

A não ser que a morte seja derrotada, pela primeira vez, a não ser que a morte não seja absoluta, definitiva e, naturalmente, fatal. Para que a jornada continue, a vida deve se sobrepor à morte. Se não, que será de nós?

Hoje, o dono precisa crer, mais do que nunca, na ressurreição. Precisa saber que a vida continua depois da morte, que a semente brota e volta a nascer. Precisa da Páscoa para conseguir depois aceitar o Natal, tem que acreditar que a estada no deserto acaba, ainda que dure por muito tempo, mas acaba e desemboca num lugar onde há leite e mel, onde as uvas são imensas e podemos nos embriagar de vinho e sol.

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