segunda-feira, 22 de agosto de 2005

Só reafirmando que a vida agora é boa

Minhas senhoras, meus senhores, é preciso que vocês me perdoem pela repetição que cometerei aqui. Mas o caso é que não deixo de me supreender pelo gosto bom que a vida deixou hoje quando desceu pela garganta do dono da voz. E o melhor de tudo é que ela é boa sem motivo, porque nenhum problema arredou pé e as nuvens no horizonte não são daquelas muito brancas de algodão.

A vida é boa porque agora ele pode, quando lhe der na telha, ir ver outra vez a casa de Cora Coralina em Goiás Velho, ou resolver perambular em Diamantina ou ver as estátuas de Aleijadinho nas próximas férias, sem precisar pensar em quem irá com ele. A grande descoberta do dono da voz é: eu sei viver sozinho. Há tanta coisa para ser descoberta! Há tanta gente para se conheceer! Há os palhaços no circo! Alguém aí não gosta dos palhaços? Que não vá ao circo então! Já é tarde? Ora, qual o problema, ele não está com sono e pode ficar até o céu se acender outra vez! Ela não quer caminhar? Ele quer, e portanto vai andar até ficar perdido se estiver disposto!

Um grande viva aos palhaços, aos cachimbos, às caminhadas no fim da tarde e à noite!

quarta-feira, 17 de agosto de 2005

Retomadas

É até meio ridículo constatar que, tão pouco tempo depois, ele anda por aí como se nunca tivesse experimentado dias angustiantes como viveu há poucos meses atrás. Não faz muito ele mal sabia como fazer para enfrentar o dia que começava na manhã seguinte, tinha desaprendido a viver por si só. Agora é como se a vida toda nunca tivesse deixado o controle das suas próprias mãos: como se ainda fosse um moleque, anda cheio de projetos e perspectivas, muito mais para ser feito do que cabe na sua existência. Lembremo-nos de que o seu tempo neste mundo já não é mais inteiro, porque pelo menos um quarto da vida ele já viveu.

Como alma nem grande, mas longe de ser pequena, ele agora já sabe que tudo valeu. Se não do jeito que ele queria, pelo menos para aprender que tudo passa, a vida vem mesmo em ondas como o mar. De vez em quando o mar arrasa com a praia --- foi vida demais. Outras vezes, a maré baixa e a vida não chega para livrar a areia do calor do sol. Mas quem duvida que o mar está lá?

Portanto, meus caros, quando o dono desta voz que lhes fala ficar tão atarefado que não me deixar trazer notícias, não pensem que nunca mais a voz falará. Eu também venho em ondas, como o som.

quarta-feira, 3 de agosto de 2005

Nova Iorque (IV) – 22 de junho

A porta que se abre para a rua é também a tampa de uma caixinha de música que é a própria cidade. Toda vez que se chega à rua, provavelmente pelo incentivo do sol morno brilhando nesses dias longos e satisfeitos de vida do verão existem no ar sons que levam ouvidos farejadores para degustar alguma melodia nova, diferente de todas as que foram experimentadas ontem e antes e amanhã e depois.

Há uma performance exclusiva e própria de cada dia e lugar. Tinha uma dupla cantando músicas de um país que esse já não é mais. Também não é mais possível rever o show, ainda que se retorne ao mesmo parque, à mesma esquina, à mesma estação em que eles estiveram. A mesma singularidade, e só o fato de serem coisas únicas é que se repete, com o bluesman, a flautista, o mexicano que tocava Besame mucho, a negra tocadora de tambor e também o solitário cantor. Um pedacinho de música por vez, um bocado de canção, e isso é que vai mantendo os dias leves apesar do peso quente do calor e dos trastes que cada um carrega dentro de si.